Reforma no código florestal brasileiro

Nos últimos anos tem-se discutido muito a possibilidade de mudanças no Código Florestal Brasileiro, lei que regulariza o uso de áreas nas propriedades, principalmente as áreas de preservação ambiental. Em 1934, foi criado o primeiro código florestal, com restrições do uso da propriedade, principalmente para equilibrar a produção agropecuária com a proteção de elementos naturais, para garantir a manutenção de cursos d’água e encostas. Em 1965, foi criado o código florestal como o conhecemos, a não ser por posteriores modificações importantes em 1989 e em 2001.

O Código Florestal normatiza principalmente as áreas da propriedade que não poderão ser cultivadas, trazendo dois conceitos importantes: o de Áreas de Preservação Permanente (APP) e o de Reserva Legal (RL). Áreas de Preservação Permanente são aquelas áreas que, para preservação de alguma função ou serviço ambiental exercido pela cobertura vegetal, devem ser mantidas preservadas. São elas, principalmente, topos de morro, áreas de encosta com declividade maior que 45 graus e áreas em torno de corpos d’água. Essas áreas pretendem, portanto, preservar o solo de erosões e preservar cursos d’água de regimes de seca, eutrofização e assoreamento. Reserva Legal são áreas, diferentes das APPs, que devem ser preservadas para manter a biodiversidade do país e são determinadas em termos de percentuais do total da área da propriedade. As áreas de APP são relevantes, inclusive, para manter a produtividade da propriedade, já que o excessivo desflorestamento, devido às chuvas, levaria ao empobrecimento do solo com remoção de seus componentes orgânicos e inorgânicos pela erosão e, consequentemente, ao assoreamento de rios e lagos. A manutenção da fauna e de diversidade de plantas reduz o número de pragas nas culturas e garante a polinização. A delimitação das áreas de APP aconteceu após estudos técnicos ao longo de muitos anos, que embasaram as decisões de tamanho e quais áreas deveriam ser preservadas.

Facções da sociedade alegam ser um código excessivamente restritivo e punitivo. Estabelece metas, mas não dá condições adequadas de a população aplicá-las. Há mais de dez anos já existem discussões acerca do Código Florestal, com grandes debates entre setores da sociedade. O assunto voltou à tona com a aprovação no Congresso de uma reforma. As discussões de mudança no código florestal visam reduzir as exigências de áreas para APP e RL. Há dois lados da questão: a proteção ambiental e o modelo de proteção agrícola, que podem ser analisados por perspectivas econômicas, sociais, ambientais e ideológicas. Uma vez que o código atual permite o uso, ainda que com restrições, de área de RL e APP, é questionável a qual tipo de produção o estabelecimento dessas áreas estaria prejudicando. São diversas as consequências de aprovação do código florestal e consequente redução das áreas preservadas. Conforme especialistas, a redução de área preservada no país traria aumento de risco de ocorrência de erosão, deslizamento e enchentes, em zonas rurais e urbanas, perda de biodiversidade, redução de serviços ambientais fundamentais para o aumento de produção agrícola. Apesar da importância sem precedentes das Unidades de Conservação, a maior parcela de área preservada no país se dá através de APPs e RL.

As mudanças no código envolvem ainda questões relativas à produção de alimento, biomassa e fibras através da agropecuária. A segurança alimentar não depende da produção de alimento, e sim do acesso ao mesmo. Mudanças nos preços da produção, principalmente de países em desenvolvimento, podem comprometer o acesso, até o momento em que a elevação dos preços proporcione oportunidades de crescimento da produção de alimentos e geração de emprego e renda para esses mesmos países.

Há diversas empresas mobilizadas contra e a favor das mudanças no Código Florestal brasileiro. Em 2011, 30 empresas de base florestal — produtoras de papel e celulose — e ONGs ambientais lançaram um documento conjunto com propostas para a revisão do Código Florestal pelo Congresso. A moratória da soja, iniciativa de empresas do setor de não comprarem soja de áreas desmatadas na Amazônia, foi reforçada pela Amazon Alliance – grupo internacional formado por empresas consumidoras de soja brasileira, como McDonald’s, Carrefour e Tesco – que reafirmou seu compromisso com o desmatamento zero. Enquanto a cadeia da soja avança atingindo padrões internacionais de preservação ambiental, há uma grande discussão se as leis não estariam na contramão, ampliando as possibilidades de desmatamento.

Ainda que as mudanças no código sejam políticas, há alternativas que podem auxiliar as práticas de conservação, como o pagamento por serviços ambientais, pagamentos por manutenção de florestas como reserva de carbono, estudos locais para preservação de áreas críticas para evitar enchentes, deslizamentos etc. O fato é que nenhuma organização estará isenta das consequências sociais, ambientais, econômicas e políticas de qualquer mudança em uma legislação desse porte.

Nos países desenvolvidos há uma tendência de aumento na quantidade de florestas protegidas, conforme estudo do Imazon e Proforest em 2011 (ver figura 1).

Figura 1 - Evolução da proteção de florestas em países selecionados

Fonte: Imazon e Proforest, 2011