Operacionalização do desenvolvimento rural

Os programas da Fundação Nestlé Brasil são norteados pelos mesmos três pilares – nutrição, água e desenvolvimento rural –, sendo o Programa Nestlé Saber o responsável pela atuação no desenvolvimento rural de regiões com baixos indicadores sociais no país.

Para realizar sua estratégia, a Nestlé lança mão de parcerias que possam operacionalizar os programas e contribuir para potencializar a criação de valor compartilhado almejado pela empresa. As parcerias envolvem governo e órgãos regulatórios, organizações da sociedade civil, instituições acadêmicas e profissionais, além das comunidades locais.

Em seus esforços pelo desenvolvimento rural, a empresa abrange as questões da geração de renda, da inclusão e do aumento da qualidade e da quantidade da oferta de alimentos para a população. O desafio é oferecer alimentos com alto conteúdo nutricional, cada vez mais acessíveis à população, mas produzidos com cuidados de conservação da água, do solo, do ar e da biodiversidade.

Um breve cenário: agricultura familiar e os desafios da pecuária leiteira no Brasil

Segundo dados do Sebrae, a agricultura familiar responde por 56% do leite produzido no Brasil. Temos hoje 4,3 milhões de propriedades geridas por agricultores familiares, das quais 1 milhão produz leite e o tem como seu principal produto. Diferentemente de uma safra de grãos, que é sazonal, o leite é uma fonte de renda constante para a pequena propriedade rural. A baixa produtividade, porém, é apontada como um dos gargalos do setor.

A produtividade nacional média é uma das mais baixas entre os países produtores de leite: apenas 1,34 mil litros/vaca/ano, número abaixo da média mundial de 2,34 mil litros, e muito baixo quando comparado aos 9,34 mil litros dos Estados Unidos e 7,19 mil do Reino Unido. Entre os maiores produtores do mundo – entre os quais, o Brasil ocupa a 5a posição – apenas a Índia tem produtividade mais baixa que a do Brasil, de 1,15 mil litros por ano 18.

A maioria dos pequenos produtores tira de três a cinco litros de leite por vaca a cada dia, mas o investimento na profissionalização da gestão da propriedade, no manejo e em técnicas de produção pode quintuplicar essa produtividade , o que coloca em evidência a importância da capacitação de profissionais de assistência técnica e do apoio à pesquisa. Elevar a produtividade com qualidade é um dos grandes desafios do setor leiteiro no Brasil.

Segundo a Associação Brasileira dos Produtores de Leite , o volume de produção de leite é fundamental para que o produtor se mantenha e cresça na atividade. Não adianta um produtor ter um baixo custo de produção se a sua produção também for baixa, visto que a pequena renda obtida no final do mês o impedirá de fazer investimentos na atividade. A entidade explica que essa situação é típica da pequena propriedade familiar, sendo grandes as chances de exclusão social e econômica dos filhos desse produtor que, não podendo continuar na atividade, deixam o campo para recorrer a subempregos na cidade.

O aumento da produção depende basicamente de investimentos em fertilidade do solo, melhoramento de pastagens, genética animal e alimentação. O produtor deve ser bem orientado para desenvolver um planejamento adequado ao seu contexto e dispor de tecnologia viável e acessível para o desenvolvimento da atividade, o que torna fundamental o papel da pesquisa e da extensão rural.

Programas de desenvolvimento rural

Face aos elementos apontados nesse cenário, uma das maneiras estruturadas de compartilhar valor pela Nestlé tem sido colocar o produtor rural em contato com o conhecimento científico e as melhores tecnologias desenvolvidas em universidades e centros de pesquisas brasileiros. Três projetos têm funcionado como canais de disseminação do conhecimento gerado nesses centros de excelência para os pequenos produtores familiares de leite:

  • Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira (PDPL), em parceira com a Universidade Federal de Viçosa (UFV-MG)
  • Programa Andradina, no interior de São Paulo, em convênio com a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP)
  • Programa Ficus, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

São projetos de transferência de tecnologia que contribuem para gerar renda e melhorar a qualidade de vida no campo, aumentando assim as chances de permanência de famílias de pequenos produtores em suas propriedades.

Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira (PDPL)

O Programa de Desenvolvimento da Pecuária Leiteira (PDPL), criado em 1988, prepara jovens profissionais para o mercado de trabalho e oferece assistência técnica e gerencial gratuita às propriedades de famílias de pequenos produtores rurais. O programa conta com a parceria das Universidades Federais de Viçosa (UFV-MG) e de Goiânia (UFG-GO) e participam alunos cursando os últimos anos de Ciências Agrárias (Medicina Veterinária, Agronomia e Zootecnia), que aplicam no campo as teorias e técnicas desenvolvidas na universidade. No processo, transferem tecnologia para os produtores, interagem com as diferentes áreas das propriedades e aprendem a desenvolver soluções para a atividade rural.

Desde seu início, em 1988, o PDPL treinou 1108 estudantes, sendo 69 em 2010, os quais trabalharam com 43 produtores em Viçosa e 15 em Goiânia . O acesso ao conhecimento e à tecnologia permite ao produtor aprimorar o gado, fazer o manejo correto, ter controle sobre os custos, aumentar a produtividade e os ganhos financeiros, ao mesmo tempo em que deve observar os cuidados com o meio ambiente. São condições que favorecem sua permanência na atividade.

- Ganhos em produtividade e qualidade

Ao longo dos anos, o PDPL vem apresentando aumentos significativos de produtividade e de qualidade do leite. Na região de Viçosa, a produção por vaca cresceu 370%, indo de 4,3 litros por dia, em 1989, para 15,34 litros por dia, em 2011. Em Goiânia, passou de 9,84 litros por dia, em 2005, para 14,51 em 2011. Por exemplo, o produtor Geraldo Aleixo Gonçalves, dono de uma propriedade em Porto Firme (cidade a cerca de 30 quilômetros de Viçosa), tinha no início do programa uma produção abaixo de 100 litros/dia de leite. Sua produção atual é de 500 litros/dia, conseguida por meio de melhorias genéticas e de alimentação. Outro produtor, Antônio Maria da Silva Araújo, produzia ao redor de 4,8 litros/dia por vaca, chegando hoje a produzir, na média, 25 litros/dia. Seu rebanho saiu de um total de 200 litros/dia para atuais 3.000 litros/dia . Há relatos de produtores que chegaram a dobrar a produção de leite em três anos. A participação no Programa se reverte não apenas em ganhos de renda, mas também de planejamento e gerenciais.

Programa Andradina

Implantado em 2005 em um assentamento rural no interior de São Paulo, o Programa Andradina busca desenvolver a produção de leite e torná-la mais autossustentável, oferecendo oportunidade de aumento de renda e contribuindo para a permanência do produtor e de sua família no campo. O Programa foi desenhado para auxiliar os assentados da reforma agrária da região, que enfrentavam sérias dificuldades de sobrevivência, pois não tinham condições de tirar o sustento de sua família do pedaço de terra que receberam.

Fruto da parceria entre a Nestlé/DPA (Dairy Partners Americas, empresa dos grupos Nestlé e Fonterra) com a ESALQ/USP, o programa é financiado pela empresa e disponibiliza um técnico em período integral aos pequenos produtores, além da visita mensal de pesquisadores da ESALQ. Em 2011, 28 famílias foram assistidas.

Os produtores, ao terem seus animais bem tratados, com cuidados de saúde, manejo e nutrição adequada, tiveram aumentos consideráveis de produção, que chegou a aumentar 100% depois da orientação obtida, como no caso da produtora Jandira Vieira Pereira, que relata ter saltado de uma produção de, no máximo, 60 litros por dia para atuais 130 litros por dia. A perspectiva é que essa produção possa chegar a 500-100 litros por dia, o que estimula enormemente os produtores. “Você tem a melhoria do bem-estar em casa, vê a sua produção, vê seu trabalho, vê o resultado, isso é muito gratificante pra gente” relata a produtora Ivanilde Gonçalves Ribeiro.

O impacto na renda dos produtores se torna perceptível com a melhoria das condições de vida dos assentados, além da movimentação da economia local. “A gente trabalha e o resultado vem no fim do mês. Consigo pagar a escola da minha filha, o que antes não dava”, relata a produtora Cícera Merquides Contardi. Seu marido, José Luiz Contardi, sintetiza: “Depois que eu comecei a obter orientação, eu diminuí meu rebanho, mas minha produção dobrou. É o antes e o depois. Antes eu não conseguia enxergar esse ponto. Agora a gente já consegue visualizar, ver o objetivo e trabalhar para chegar lá”. A perspectiva de uma vida mais digna, com base em uma atividade leiteira que gera renda e capacidade de poupança para investimento surge como um benefício concreto para indivíduos que anteriormente viam um horizonte incerto, havendo o risco de ter que voltar pra cidade em busca de trabalho. Isso sem mencionar as possibilidades de desenvolvimento oferecidas pelos conhecimentos técnicos e gerenciais adquiridos.

Programa Ficus

Seguindo o modelo do Projeto Andradina, de promover o desenvolvimento socioeconômico de forma sustentável da produção leiteira da agricultura familiar proveniente do processo de reforma agrária, a Nestlé/DPA iniciou, em julho de 2009, o Programa Ficus. Envolvendo os produtores da região próxima à fábrica da DPA de Palmeira das Missões, município do Rio Grande do Sul, o programa conta com a coordenação técnica da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e visa estimular o desenvolvimento da cadeia de suprimentos da Nestlé/DPA e propiciar a permanência do produtor no campo.

Em 2011, o programa atendeu 28 produtores. Um técnico acompanha a evolução dos trabalhos quinzenalmente, em cada propriedade assistida. Uma vez por mês, os representantes da universidade visitam os assentamentos e fazem uma reunião em uma das propriedades, com a presença de todas as famílias, quando realizam apresentações técnicas sobre temas como adubação e manejo de pastagens, procedimento de higiene na ordenha, uso de touros e inseminação, práticas de alimentação etc. Os assuntos são escolhidos em função da atividade da estação, das observações dos pesquisadores, ou atendendo a solicitações dos técnicos da DPAM. Todos os produtores do assentamento são convidados e a presença é obrigatória para os assistidos pelo FICUS. Com a participação de outros produtores na reunião, identificam-se aqueles com perfil para integração ao projeto . Para participar dos programas Ficus e Andradina, o produtor não precisa ser fornecedor da DPA, mas deve seguir 100% das orientações técnicas combinadas e participar de pelo menos 70% das reuniões.

Semelhantemente ao Programa Andradina, ao introduzir técnicas de gestão, a iniciativa traz incrementos na qualidade e quantidade da produção do leite. A experiência das propriedades assistidas servirá de modelo para outras famílias da região (Gráfico 1).

Gráfico 1 - Produção por vaca em lactação – programas Andradina e Ficus 19